domingo, 20 de julho de 2014

Desvio de atenção

Os domingos de manhã sempre foram meus preferidos para a leitura, não importa o tema, gosto de pegar um livro e começar a ler. Hoje acordei tarde, às dez, infelizmente. Antes adorava levantar tarde, hoje acho perda de tempo. Isso deve ser mania de adulto. Pois bem, não terei mais o prazer de ler de manhã, terei que me contentar com a leitura após o meio dia. Sou daqueles que começo vários livros e termino poucos, pra ser sincero. Um dias desses li num blog que os japoneses tem uma palavra específica para este tipo de pessoa que compra livros e começa a lê-los, mas não os termina. Tsundoku é a palavra. Não chego a ser essa pessoa, sobretudo por não comprar muitos livros, geralmente os ganho ou pego emprestado da biblioteca. Mesmo que as vezes não os devolva, mas um dia os devolverei. Principalmente os dois da Clarice Lispector que emprestei três anos atrás da Biblioteca Alceu Amoroso Lima, esquina da Cardeal Arcoverde com Henrique Schaumann. "Cidade Sitiada" e "Aprendendo a Viver." Estes li inteiro, pois amo Clarice.

Em fim, hoje especialmente me peguei lendo um de João Almino,  "As Cinco Estações do Amor." Um romance que se passa em Brasília, cheio de política e estilo. Estou na metade, tenho lido cinquenta páginas por domingo, ganhei de uma grande amiga russa, que fala português, dentre outros idiomas. Irene foi um acontecimento, amor a primeira vista. Desde o primeiro dia ela me chamou atenção com seu jeito irreverente de se vestir e seus assuntos interessantes. Linda, cheia de vida e cultura. Cabelão grande e escuro, pele branca como a neve de sua terra natal, sempre com sombra colorida no olho, gosta muito de verde. Com Irene posso conversar sobre tudo, ela entende de tudo, principalmente de arte e música. Quer dizer, não se conversa sobre notícias e programas de TV, Irene faz questão de não ter TV em casa. Admiro ela por isso também.

Enquanto leio as palavras de João Almino ao descrever a saga de sua personagem principal, Diana, tenho aqueles calafrios que me dão toda vez que ideas e lembranças me vem à cabeça. Lembro de José Arrabal, escritor que conheci em São Paulo, também lembro que comecei a ler seu livro "Stalin", mas nunca terminei. Este foi ganhado, só para constar. Deve estar guardado na casa dos meus pais junto com tantas outras coisas. Era curioso conversar com Arrabal, cheio de vida e de ideias também. Leu alguns de meus ensaios e me incentivou a largar a publicidade e começar a escrever, disse que eu tinha talento. Não dei ouvidos, porém começo a revisitar seu conselho.

Tenho muitas ideias enquanto leio, muitas mesmo por sinal. Tantas que quase não consigo controla-las e por vezes elas nem saem da minha cabeça. Quero escrever, mas não quero parar de ler, quero saber o que vai acontecer, quero acabar de vez com o livro. Quero tantas coisas ao mesmo tempo. Meus pés esticados na mesinha de centro da sala sentem a vibração do celular que está sobre outros livros. Ignoro, preciso desse momento longe de tecnologia, preciso de papel e palavras novas escritas por gente estranha. Aprendo algumas, tipo chauvinismo. Já tinha escutado esta antes, mas nunca parei para ler seu significado, deriva do Francês Nicolas Chauvin, soldado de Napoleão Bonaparte, e significa patriotismo exagerado. Fonte: Wikipédia e Dicionário Michaelis.

Entre outras palavras e sentimentos, tento me concentrar na leitura. Enquanto leio penso em parar de ler para anotar palavras, desisto no mesmo segundo, penso novamente em parar para ver quem chama no celular, resisto. Aposto ser nada importante. Talvez é algum grupo do Whatsapp, com pessoas importantes que me inspiram muitas vezes, mas que podem esperar, é longe de ser urgente. Viro a página, quero novamente parar para começar a escrever este texto, coloco como meta mais dez páginas, sigo em frente, e paro quando me deparo com chauvinismo. Quero contar em palavras sobre como meu pé sentiu o celular tremer e quase desviou minha atenção, quero discorrer sobre como estamos mais sensíveis a cada dia que passa com tanta informação, quero falar que anos atrás peguei livros emprestados, nunca os devolvi, mas que desejo devolvê-los, e principalmente quero dizer que a manhã de domingo já virou tarde e preciso decidir se vou ao cinema assistir mais um filme de Hollywood ou se permaneço em casa germinando ideias e desviando minha atenção.

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